quinta-feira, junho 30

Crescer

Lili me fez aqui ficar pensando na infância, e acaba que me sinto obrigada a discordar dela. Não acho que a existência na infância e na adolescência tenha essa plenitude toda não. Em muitos aspectos, agradeço por já ser adulta e por ter ultrapassado fases tão terríveis da vida.

Acho que poucas coisas podem ser mais antônimas do que segurança e liberdade. Quando crianças somos (em lares normais, é bom que se diga) superprotegidos, mas não temos liberdade... esse balanceamento vai se invertendo no decorrer da vida, e é certo que conforme os anos vão passando, a segurança vai indo embora junto com as nossas certezas e os nossos heróis, e dando lugar à liberdade que vamos conquistando aos poucos, até que, finalmente adultos, maduros, já não temos proteção nenhuma, certeza nenhuma, a vida está inteiramente nas nossas mãos, mas em compensação - que maravilha - é uma página em branco que temos à nossa frente, à nossa disposição para qualquer loucura, qualquer erro, qualquer burrada. Não, não se pode voltar atrás, não há segunda chance, a trajetória não pode ser apagada, mas sempre há futuro e, não importa qual seja o seu tamanho, ele sempre será uma imensa página em branco à nossa disposição.

Tentei me lembrar das coisas que me afligiam na infância - os terrores noturnos, o medo de dormir sozinha, não poder fazer o que eu queria na hora em que eu quisesse, e o não entendimento. Não entender era o pior, porque quando a gente é criança não entende porque tem que ir pra escola, porque tem que comer verdura, porque tem que dormir cedo, porque tem que ser educada com as visitas, porque tem que escovar os dentes... e não adianta dizer que no futuro a gente vai entender tudo e vai ver o quanto era bom, porque isso vai ser bom no futuro! Na hora, no decorrer dos quatro, sete, dez anos, a gente se revolta, chora, se indigna e o sofrimento é bem, beeem real.

Eu também tenho esse ímpeto de proteger crianças. De querer abraçar. De olhar para os seus olhinhos ingênuos e felizes e quase morrer de dor, desejando do fundo da alma que elas pudessem não crescer para não sofrer. Só que eu acho que isso no fundo, é um equívoco. O que eu queria, de verdade, era que elas crescessem mantendo aqueles olhinhos. Olhinhos que eu até vejo em alguns adultos, e invariavelmente, são exatamente os adultos pelos quais eu me encanto e me apaixono.

Não sei se existe alguma fase da vida em que a gente possa experimentar essa plenitude, essa sensação de existência inteira. Mas, se existe, certamente não é a infância. Dizemos às crianças que ser adulto é ruim, somente porque aqueles monstros da infância não nos assustam mais. Mas nos esquecemos que, com a mais absoluta certeza, os nossos monstros da maturidade, que nos enchem de dúvidas, esmagam nosso peito e nos tiram o sono, não representam nada, rigorosamente nada, absolutamente nada para uma criança. Mas eles existem! Tanto os deles quanto os nossos... são monstros que nos acompanham no decorrer da vida e apenas trocam de nome e de formato. Mas nunca deixam de nos rondar.

Talvez o segredo para levar bem a vida e o passar dos anos seja mesmo acreditar que o melhor momento é sempre agora. Livres, apavorados, culpados, perdidos, inseguros. Mas vivos agora. Com o futuro inteirinho pela frente... quanto tempo ele vai durar? Um dia, um ano, dez, cinquenta? A gente não sabe... mas isso, o bebezinho que acabou de nascer, que está abrindo os olhos pela primeira vez nesse exato momento também não sabe. Para nós, como para ele, o futuro é uma coisa só. A página em branco que é só, e inteiramente, nossa.

Um comentário:

Lili Cheveux de Feu disse...

legal ver o que tu acha e que é tão diferente do que eu acho hoje [hoje, 30/6/11, me sentindo sofrendo de sindrome de peter pan, rsrsrs], de saco cheio de me ver presa por amarras muito maiores e mais complexas que, por exemplo, os pais, como quando eu era criança... hoje eu sou obrigada a fazer coisas que não são como ir à escola e não entender o por que. hoje eu sou obrigada a fazer coisas que, até sei pq faço, mas não aceito, não concordo, doem, precisam de mil análises, mas não tenho escapatória. e acho que isso irá doer muito mais no futuro pois tenho certeza de que, chegando na próxima fase da vida, olharei para esta fase aqui e ela não será compreendida da mesma maneira que você descreveu no 3º parágrafo. essa é a única realidade que existe daqui pra frente, não haverá grandes modificações no entendimento dos fatos e pq dos fatos, pois eu já vivo no mundo real dos adultos... e é por isso que eu sinto uma puta falta de me indignar com a minha mãe ao invés de me indignar com o mundo.