sexta-feira, abril 1

Os escafandristas virão explorar sua casa, seu quarto, suas coisas, sua alma, desvãos...


Atafona, no norte do Estado do Rio de Janeiro, está sendo engolida pelo mar. Nâo se trata de um tsunami. Há 40 anos, o mar vem subindo, devagarinho, trazendo areia, enterrando ruas, casas, quarteirões inteiros...

As fotografias da matéria são impressionantes, e embora não deva ser nada fácil para quem tem que abandonar suas casas e deixar suas coisas, não há como negar um certo lirismo nas imagens da natureza, pouco a pouco, tomando de volta o que é dela... como se tentasse lutar contra a destruição que estamos provocando na terra.

Devagar, como se nos avisasse que apesar de todas as nossas dores e esforços, de uma hora para outra, tudo pode submergir. Assim, sem julgamento, sem diferenciações, sem seleção moral. Simplesmente o mar, depositando areia onde nós, presunçosos, havíamos colocado concreto, asfalto e pedra, em nossa estúpida busca por estabilidade e solidez.

A lentidão com que o fenômeno está acontecendo, e a imponência silenciosa dos bancos de areia e do mar calmo parece que combinam com a placidez da pequena cidade. Por mais comovente que seja saber que pessoas têm que recolher suas coisas para recomeçar suas vidas um pouco mais acima, um pouco mais longe, não deixa de ser reconfortante a imagem de um planeta livre de nossas interferências, tomado pelas águas. Silencioso, aconchegante, latente, azul. Séculos e séculos esperando o surgimento de novas formas de vida, que talvez se desenvolvam, e um dia, sejam tomadas de assombro quando mergulharem por entre os restos das nossas cidades. O assombro então não será pelo mar que invade o concreto, mas pelo concreto que repousa, misteriosamente, no mar.

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