Fui gentilmente apresentada a este link que reúne alguns textos de Carlos Heitor Cony sobre a sua convivência com suas duas imensamente amadas [e infelizmente já falecidas] cachorrinhas...
Eu realmente não sabia do seu amor pelos cães e me comovi com os seus textos... Segue o primeira "declaração de amor" deste apanhado.
Mila
de Carlos Heitor Cony
31/01/1994
RIO DE JANEIRO - Recebo o bilhete de Octávio Mello Alvarenga. Uma de suas Setters (ele tem duas, como eu) dera ninhada, nove diabinhos ruivos, olhos cor de mel, tão difíceis de criar que criam logo um problema e uma dor. O problema é como ficar com toda a ninhada. A dor é ter de dar (há infelizes que vendem mas são desnaturados que envergonham a já envergonhada raça humana). Numa hora dessas, escolhe-se os amigos do peito e os bananas de sentimento. Octávio honrou-me, pensando me oferecer uma delas.
A primeira vontade é aceitar. Perdido por duas, seria fácil perder-me por três. Mas Octávio é mineiro, romancista, presidente da Sociedade Nacional de Agricultura, foi genro de Drummond de Andrade. Dele se pode esperar as melhores coisas — não iria cometer o crime, pior do que o crime, o exagero de criar-me um problema de consciência e afeto. Mesmo assim, como o assassino que poupou a vida da vítima mas não lhe quer poupar a ameaça, comunicou-me o perigo que me rondara.
Sim, ele tinha razão. Eu não podia ganhar mais uma Setter. A duas que tenho, mãe e filha, enchem-me a casa e a vida. Mila também teve ninhada, fiquei com uma de suas filhas, uma coisa fofa e chameguenta que alegra meus dias e me perturba as noites, quando cisma de dormir comigo.
Mila é mais sóbria, mais sólida e sábia. Na noite em que meu pai morreu, vim em casa tomar banho, fazer a barba, trocar de roupa, preparar-me para o dia que me aguardava. Sempre que coloco a chave na fechadura, por menor ruído que faça, ela se coloca atrás da porta e espera. Pula em cima de mim, seu hálito aquece meu pescoço, seus olhos procuram os meus e ela me lê. Sabe como estou, como foi meu dia e como está a vida.
Naquela noite não pulou, nem olhou meus olhos. Cabeça baixa, rabo entre as pernas, ela sabia. Eu não avisara a ninguém mas a ela nada precisava dizer. Encostou-se aos meus joelhos, cúmplice e solidária. E ela, que do mundo lá fora esperava um pai, do mundo lá fora recolheu um orfão.
domingo, janeiro 30
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7 comentários:
Lili............. obrigada pelo texto!
beijos lindona. não suma tanto.
Sempre fico com os olhos cheios d'agua quando leio esses artigos do Cony. Tinha certa admiração por ele antes, e depois que li sobre a relação dele com seus cães, virei fã numero um mesmo. Há um texto, que ele escreveu no dia em que a Mila morreu, que é uma das coisas mais bonitas e mais tristes (e verdadeiras) que já li até hoje.
Brigado pela delicadeza asssim, logo pra começar a semana. Beijo.
Esse texto é lindo!!
Semana que vem, eu quero conversar com vc ao vivo sobre o meu possível plano de ter mais um cachorro.
Mais um Saulo??? Mas você já não tem dois, criatura???!!!
Qual é o segundo? Você??
hahahahaha... eu acho ótimo você ter um terceiro cachorro, saulinho. rsrs. eu acho que um cão precisa muito da companhia de outro.
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